domingo, 25 de abril de 2010

Sobre o Teatro Mágico


O Teatro Mágico é um grupo musical, no mínimo, diferente de tudo aquilo que estamos acostumados a ver e ouvir nos tempos de hoje. Tem um estilo completamente peculiar e bastante original. Pintados e fantasiados, levam música, poesia, teatro e reflexão ao seu público crescente. Fernando Anitelli, o líder da trupe, é um músico e compositor diferente de todos aqueles que temos hoje (não só na música brasileira como também no cenário internacional). O Teatro Mágico surge e cresce dentro de um contexto de ídolos cada vez mais toscos, forjados e iguais. Em um tempo de Emo, Forfun, Fresno e NxZero, Anitelli nos faz lembrar de Renato Russo, Humberto Gessinger, Cazuza (ainda que eu não seja muito fã deste) e Chico Buarque. O Teatro mágico não é só música: é poesia, reflexão, crítica e protesto. Seria a nossa luz no fim do túnel num mundo aonde os ídolos, gostos e opiniões são manipulados e forjados. Seria uma esperança num tempo de um país com uma educação cada vez mais débil e brasileiros cada vez menos críticos.

Para minha grande decepção, o TM apareceu, ontem (dia 24 de Abril de 2010), na novela “das nove” da Rede Globo, tocando a canção O anjo mais velho na inauguração de um restaurante. Foi, no mínimo, ridículo. Claro que Anitelli daria uma justificativa: “Participar de um trabalho de Dramaturgia da Globo sem precisar pagar, pedir e ou se vender à qualquer postura é algo fabuloso e corajoso! A idéia foi de que o Teatro Mágico se mostrasse como é... o circo, a poesia, a música, a encenação... tudo com muito respeito e dignidade! Não houve a questão "dinheiro" em nenhum momento... (isso é coisa de quem acha que a vida é somente enraizada neste aspecto...) Foi um convite... nos chamaram e nós fomos, simples assim, foi o que fizemos... e digo: Foi animal! Saber que uma trupe que projeta todo seu conteúdo de maneira livre, que articula um movimento discutindo tudo isso e move outros músicos de outras regiões em unidade contra o jabá no rádio e na TV conseguiu este convite de maneira clara e explícita... é uma grande vitória! E é isto que eu gostaria de compartilhar com vocês”. Gustavo Anitelli, no site oficial da trupe, em um texto que também justifica a participação da banda na novela, argumenta: “sob ameaça de nos prejudicar, nunca deixamos de defender um Brasil diferente, justo, democrático e transformador…..Pra gente, fama, sucesso e dinheiro é muito pouco….é nada….o que nós queremos é fazer história!”. Não me convenceram. Ora, Fernando, a questão não é o fato de terem recebido dinheiro ou não para participar ou mesmo se houve o jabá. Com relação ao ponto aonde quero chegar, dá no mesmo. Ora, Gustavo, se fama e sucesso é nada, para quê aparecer na novela? Se o ideal é levar a filosofia do TM ao público dessa emissora de televisão, Afinal, duvido muito que os telespectadores ficaram sabendo qual o nome da banda que tocou na inauguração do restaurante (estavam mais preocupados com a história e as falas – interessantíssimas – das personagens da novela) e, se ficaram sabendo, duvido que passarão a escutar e/ou entender a proposta do Teatro Mágico (pensando bem, acho que, a partir de ontem, eu também passei questionar qual a verdadeira proposta do TM). Um país mais justo, livre e honesto é um ideal maravilhoso. Mas será que é desta forma, nos submetendo ao poder daqueles que contribuem para a desigualdade e injustiça, que poderemos ter um país melhor?

Os Anitelli só não entenderam que, para mudar nosso país, não devemos lutar pelos canais que eles nos oferecem; devemos lutar por canais alternativos e inesperados. Devemos modificar a estrutura da sociedade e não se adequar a ela, como vocês fizeram ao aceitar o convite da rede Globo. Para mudar e transformar a sociedade devemos romper os limites das estruturas sociais. Logo, o Teatro Mágico deixa de ser um movimento. Era um movimento quando enchiam as casas de shows sem aparecer na televisão ou no rádio, quando atraíam milhares de pessoas sem utilizar os meios de comunicação tradicionais. O Teatro Mágico deveria incomodar, deveria irritar, deveria intimidar, deveria ameaçar a televisão e o rádio. O TM não devia, portanto, se acomodar com o que incomoda. Por esses meios e dessa forma, não conseguirá transformar nada: estão apenas fortalecendo um status quo que dizem criticar e combater. Como visto em uma parte da música Xanéu nº 5, “quem tem medo assimila toda forma de expressão como protesto”. Eles não vêem protesto. Eles não têm medo do Teatro Mágico. O que é uma pena.

Encontrei o vídeo abaixo no Blog do Luis Nassif, sendo este montado, também, com cenas do curta Nada a declarar, de Gustavo Acioli. Somente a título de curiosidade, o curta de Acioli fala do papel do sonho nas nossas vidas, do papel do intelectual na sociedade brasileira e da própria sociedade brasileira. Um excelente documentário...Fica aí a dica.